O Corpo que Ouve: Experiência Sensorial e Percepção Corporificada de Surdos

(Português + Língua Brasileira de Sinais)

O legado teórico de Marcel Mauss (2003) atravessou décadas, permanecendo como uma importante reflexão antropológica. Dentre vários temas que o autor abordou, o corpo merece destaque nessa proposta. Antes tratado somente a partir das ciências naturais, em Mauss, o corpo passa a ser entendido como moldado de acordo com a sociedade na qual o indivíduo está inserido, sendo um produto social e cultural. No campo filosófico, Maurice Merleau-Ponty (1994), ao explorar a fenomenologia do corpo, argumenta que a percepção é sempre corporificada, ou seja, mediada pelo próprio corpo em interação com o ambiente. Os mesmos captam os estímulos ambientais e corporais, interpretando os mesmos à luz de sua experiência no mundo. A partir dessas colocações, podemos afirmar que a percepção do mundo pelas pessoas surdas não pode ser definida apenas pela ausência da audição, mas também pela forma peculiar de estar no mundo, onde a visão e a visualidade desempenham um papel fundamental em sua organização cognitiva. Os surdos constroem uma forma de percepção baseada na visão, reconfigurando e ressignificando sua experiência no espaço social. O conceito de Deaf Space (Haualand, 2011) ilustra essa percepção espacial ampliada, refletida em arquiteturas pensadas para favorecer a comunicação visual e o contato gestual. Além disso, estudos em antropologia dos sentidos (Howes, 2003) destacam que a experiência sensorial dos surdos não é deficiente, mas sim diferenciada, permitindo modos únicos de interação com o mundo. Este painel convida à reflexão sobre como o corpo surdo percebe e se relaciona com o ambiente, desafiando noções convencionais sobre os sentidos e a experiência humana.